Em regra, o advérbio é uma classe de palavra que se caracteriza por ser invariável. Em outras palavras, ele não apresenta flexão de gênero (feminino/masculino) nem de número (singular/plural). Mas, para toda regra, há exceções. E uma delas é o advérbio todo.
Estudiosos da Língua Portuguesa defendem que esse termo pode, sim, ser flexionado. Neste artigo, vamos explicar por quê. Confira!

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ToggleClassificações da palavra “todo”
Antes de avançarmos, é importante explicar que a palavra todo é bastante eclética. Dessa forma, ela pode ser utilizada como pronome indefinido, adjetivo, substantivo ou advérbio. Nesse sentido, a tabela abaixo lista o significado do termo em cada uma das classificações morfológicas:
Claro! Aqui está a tabela reorganizada com base no texto fornecido do Dicionário Aulete:
Classe Gramatical | Significado | Exemplo |
---|---|---|
Adjetivo | A que não falta parte alguma; completo; inteiro; total | Toda a empresa compareceu.Falou toda a verdade. |
Pronome indefinido | Qualquer, cada | O desconto será concedido a todo estudante. |
Advérbio | Completamente, por inteiro | E lá foi ela toda prosa, receber seu prêmio. |
Substantivo masculino | O conjunto completo | É preciso pensar no problema como um todo. |
Advérbio variável
Ali na tabela, você prestou atenção no exemplo que o dicionário Aulete traz de uso de todo como advérbio? Vamos relembrar:
- E lá foi ela toda prosa, receber seu prêmio.
Perceba que “toda” modifica o adjetivo “prosa”. Como sabemos, a única classe gramatical que modifica um adjetivo é o advérbio. Porém, mesmo assim, a palavra foi flexionada para o feminino. Isso está certo? O termo não devia ser invariável?
Como explica Napoleão Mendes de Almeida, “todo (…), ao mesmo tempo que exerce a função de advérbio, conserva a propriedade de adjetivo de flexionar-se, fenômeno a que se dá o nome flexão eufônica ou flexão por atração“.
Na mesma linha Domingos Paschoal Cegalla afirma que “no sentido de inteiramente ou completamente, costuma-se flexionar [o vocábulo todo], embora seja um advérbio”.
Dupla concordância
Vale destacar, no entanto, que o advérbio todo permite dupla concordância nominal. Como explica Fernando Pestana, ” todo (advérbio) pode sofrer concordância atrativa, mas a concordância gramatical é própria da norma culta”.
Nesse contexto, podemos escrever o exemplo acima de duas formas:
- E lá foi ela toda prosa, receber seu prêmio. (concordância atrativa)
- E lá foi ela todo prosa, receber seu prêmio. (concordância gramatical)
Apesar de a segunda frase soar estranha, ela está corretíssima. Como todo também faz parte de classes de palavras variáveis, essa variação acaba influenciando também o emprego da palavra como advérbio.
Além do mais, a forma flexionada agrada muito mais nossos ouvidos, não é mesmo? É por isso que Napoleão Mendes de Almeida a classifica como eufônica, ou seja, melodiosa, harmoniosa.
Conclusão
Em resumo, a palavra todo é um excelente exemplo de como a Língua Portuguesa pode ser rica e, por vezes, surpreendente.
Embora, à primeira vista, pareça errado admitir que um advérbio possa ser flexionado, a análise gramatical e o uso consagrado pela tradição revelam que, no caso de todo, isso não apenas é possível, como é perfeitamente aceitável.
A chamada flexão eufônica, respaldada por gramáticos como Napoleão Mendes de Almeida, Cegalla e Pestana, mostra que o idioma não é feito apenas de regras rígidas, mas também de escolhas estilísticas que buscam fluidez e harmonia na comunicação.
Assim, ao escrever ou falar, podemos optar entre a concordância gramatical e a atrativa — desde que estejamos conscientes do que estamos fazendo. Afinal, dominar a norma é também saber quando e por que se pode dela se afastar.