A palavra “que” é uma das mais versáteis da língua portuguesa — e também uma das que mais causam dúvidas. Neste artigo, você vai descobrir como identificar as diferentes funções que esse termo pode exercer, com explicações claras e exemplos práticos para não errar mais. Confira!
Tópicos deste artigo
ToggleFunções do “que” e do “quê”
O vocábulo “que”, sem acento, pode ser pronome, advérbio, preposição, conjunção e partícula de realce. Já o termo “quê”, com acento circunflexo, pode exercer o papel de substantivo, pronome interrogativo e interjeição.
Vamos conferir em detalhes cada uma dessas funções!
1) Substantivo
Quando acompanhado de artigo definido ou indefinido ou de qualquer outro determinante, o “quê” é substantivo. Nesse caso, por se tratar de um monossílabo tônico, ele deve sempre vir acentuado.
De acordo com a professora Amini Hauy, usamos o termo nessa função em duas situações:
a) Para falar da própria palavra:
- O quê tem muitas funções.
- O uso daquele quê deixou a frase confusa.
b) Como sinônimo de “algo” ou “alguma coisa”:
- Maceió tem um quê de paraíso.
- Na velha casa, havia um quê misterioso.
2) Pronome
O termo “que” pode ser também pronome interrogativo, indefinido ou relativo. Vamos conferir cada um dos casos!
a) Pronome interrogativo
Como pronome interrogativo substantivo, “que” tem o significado de “que coisa”:
- Que fazem aqui a essa hora?
- Não entendi ainda por que você se interessa.
Já como pronome interrogativo adjetivo, “que” tem o sentido de “qual”:
- Que livro você leu este ano?
- Perguntei-lhe que vestido ela usaria na festa.
Vale destacar que o pronome interrogativo “que”, quando vier antes de um sinal de pontuação, deve ser acentuado:
- Essa peça deve ser encaixada entre quê?
b) Pronome indefinido
Quando aparece antes do substantivo, “que” pode exercer a função de pronome indefinido. Nesse caso, ele tem o mesmo sentido de “quanto(s)” e “quanta(s)”:
- Que saudade eu tenho da minha infância. > Quanta saudade tenho da minha infância.
- Que caras feias, crianças! É só um pouco de legumes! > Quantas caras feias, crianças! É só um pouco de legumes!
c) Pronome relativo
Quando “que” for sinônimo de “o qual” ou “a qual” e estiver substituindo um nome, ele será um pronome relativo:
- Esta é a casa que te mostrei ontem.
- A baleia é um mamífero que vive no mar.
Na primeira frase, o pronome retoma o substantivo “casa”; na segunda, o substantivo “mamífero”.
3) Advérbio de intensidade
Quando amplifica o sentido de um adjetivo ou de um advérbio, “que” exerce a função de advérbio de intensidade. Nesse caso, ele é equivalente a “quão”:
- Que triste fiquei com sua partida! >Quão triste fiquei com sua partida!
- Que belas flores você me trouxe! > Quão belas flores você me trouxe!
De acordo com o gramático Carlos Henrique da Rocha Lima, “a força emocional das frases exclamativas pode ser tão poderosa, que se chegue a dispensar a presença de qualquer adjetivo – concentrando-se então no ‘que’ a ideia global qualificativa e intensificadora”.
Dito de forma mais simples, o advérbio “que” pode acompanhar um adjetivo implícito:
- Que (belo) coração o daquele sacerdote!
- Que (bela) lua temos hoje!
4) Preposição acidental
Segundo o professor Fernando Pestana, como preposição acidental, “que” equivale às preposições essenciais “a”, “de” ou “para” em certas construções:
- Você tinha que trazer o presente dela hoje.
- Há que se mudar a rota de condução do país.
- Não havia nada que fazer naquela cidade.
Vale destacar que alguns gramáticos, como Rocha Lima e Cegalla, classificam esse “que” como pronome relativo. Ademais, há estudiosos da língua, a exemplo de Manoel Pinto Ribeiro, que dizem que o uso do termo como preposição não está de acordo com a norma culta.
5) Conjunção coordenativa
a) Conjunção coordenativa aditiva
Quando “que” equivale a “e”, o termo funciona como conjunção aditiva:
- Gritei, abri os braços, mas já era outra vida que não a minha. (Vinicius de Moraes)
b) Conjunção coordenativa adversativa
Quando tiver sentido de “mas”, “que” será conjunção adversativa:
- Muitos conselhos lhe tenho dado, que não esses.
c) Conjunção coordenativa explicativa
Quando for equivalente a “pois” ou “porque”, o vocábulo “que” será conjunção explicativa:
- Descanse, que vamos partir ao amanhecer.
6) Conjunção subordinativa
a) Conjunção subordinativa integrante
Quando iniciar uma oração substantiva, “que” exercerá a função de conjunção integrante. Nesse caso, a oração que é iniciada pelo conectivo pode ser substituída por “isso”:
- Dissemos que ele iria chegar a tempo, mas nos enganamos. > Dissemos isso.
b) Conjunção subordinativa final
Quando tiver o sentido de “para que” ou “a fim de que”, o termo será conjunção final:
- Trabalhe, que alcanceis teus objetivos.
c) Conjunção subordinativa temporal
Quando “que” equivaler a “logo que” ou “depois que”, será conjunção temporal:
- Abertos que foram os portões, os fãs correram para perto do palco.
d) Conjunção subordinativa causal
Quando tiver o significado de “porque”, o conectivo será causal:
- Saiu rápido que tinha de encontrar a esposa.
e) Conjunção subordinativa concessiva
Quando for equivalente a “embora”, será uma conjunção concessiva:
- Que nos prendam, ainda seguiremos defendendo nossos valores.
f) Conjunção subordinativa comparativa
Quando aparece junto com termos como “mais”, “menos”, “maior”, “menor”, etc., “que” será conjunção comparativa:
- Tinha menos dinheiro que meus pais.
g) Conjunção subordinativa consecutiva
Quando vem acompanhado de “tão”, “tanto”, “tamanho” e “tal”, o termo será uma conjunção consecutiva:
- Tanto estudou que acabou sendo aprovado no concurso.
7) Interjeição
Como explica a professora Hauy, quando tem função de interjeição, devemos utilizar “quê”, com acento. Além disso, nessa situação, o termo não tem função sintática:
- Quê!? Não acredito no que você acabou de falar!
8) Palavra denotativa de realce (partícula expletiva)
Nesse contexto, o “que” serve como simples recurso expressivo. Assim, ele pode ser retirado da frase sem prejuízo algum para o entendimento. Nesses casos, o termo pode também aparecer combinado com o verbo “ser” – também expletivo. Vamos conferir dois exemplos:
- Qual que é o motivo do seu atraso? > Qual o motivo do seu atraso.
- Fui eu que fiz isso! > Eu fiz isso!
Classe gramatical do QUE – QUÊ
Confira na tabela abaixo todas as classes gramaticais do vocábulo “que” (“quê”):
Classe gramatical | Subfunção / Nome específico | Descrição / Valor semântico | Exemplo |
---|---|---|---|
Substantivo | — | Refere-se à própria palavra ou significa “algo”, “alguma coisa” | Maceió tem um quê de paraíso. |
Pronome | Interrogativo (substantivo) | Equivale a “que coisa” | Que fazem aqui a essa hora? |
Interrogativo (adjetivo) | Equivale a “qual” | Que livro você leu este ano? | |
Interrogativo (com acento) | Antes de pontuação, como monossílabo tônico | Essa peça deve ser encaixada entre quê? | |
Indefinido | Equivale a “quanto(s)” ou “quanta(s)” | Que saudade eu tenho da minha infância! | |
Relativo | Retoma um termo anterior e introduz oração subordinada adjetiva | A baleia é um mamífero que vive no mar. | |
Advérbio | De intensidade | Equivale a “quão”; intensifica adjetivos ou advérbios | Que bela lua temos hoje! |
Preposição acidental | — | Equivale a “a”, “de” ou “para” em certas construções verbais | Você tinha que trazer o presente dela hoje. |
Conjunção coordenativa | Aditiva | Equivale a “e” | Gritei, abri os braços, que já era outra vida. |
Adversativa | Equivale a “mas” | Muitos conselhos lhe tenho dado, que não esses. | |
Explicativa | Equivale a “pois”, “porque” | Descanse, que vamos partir ao amanhecer. | |
Conjunção subordinativa | Integrante | Introduz oração subordinada substantiva | Dissemos que ele iria chegar a tempo. |
Final | Equivale a “para que”, “a fim de que” | Trabalhe, que alcanceis teus objetivos. | |
Temporal | Equivale a “logo que”, “depois que” | Abertos que foram os portões, os fãs correram. | |
Causal | Equivale a “porque” | Saiu rápido que tinha de encontrar a esposa. | |
Concessiva | Equivale a “embora” | Que nos prendam, ainda seguiremos lutando. | |
Comparativa | Após “mais”, “menos”, “tanto”, etc. | Tinha menos dinheiro que meus pais. | |
Consecutiva | Após “tão”, “tanto”, “tal”, “tamanho” | Tanto estudou que passou no concurso. | |
Interjeição | — | Expressa surpresa ou espanto | Quê!? Não acredito no que ouvi. |
Palavra denotativa | Partícula expletiva / realce | Recurso de ênfase; pode ser omitido sem prejuízo ao sentido | Fui eu que fiz isso! |
Conclusão
A palavra “que” pode parecer pequena, mas seu alcance na língua portuguesa é imenso. Como vimos ao longo deste artigo, ela assume diversas funções — de substantivo a conjunção, de pronome a advérbio — dependendo do contexto em que aparece.
Ao identificar corretamente a classe gramatical e as funções do “que” ou do “quê”, você não só evita erros comuns como também demonstra domínio da norma culta. Afinal, conhecer a gramática é conhecer as engrenagens invisíveis que fazem a linguagem funcionar.