A regência do verbo “ser” na Língua Portuguesa

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O verbo ser é um dos mais versáteis e fundamentais da língua portuguesa. Dessa forma, sua complexidade não reside apenas em sua conjugação, mas também em sua regência, que varia de acordo com os sentidos que o verbo pode assumir.

Neste artigo, exploraremos as principais construções sintáticas envolvendo o verbo ser, com base no Dicionário Prático de Regência Verbal de Celso Pedro Luft.

Regência do verbo ser: casos e exemplos práticos

1. Verbo “ser” como verbo de ligação

Na maioria das vezes, o verbo ser é classificado como um verbo de ligação. Nessa função, ele conecta o sujeito a um predicativo, formando orações cujo principal objetivo é atribuir uma qualidade, característica ou estado. Dessa forma a estrutura básica dessas orações pode ser representada como:

Sujeito + Verbo Ser + Predicativo

Exemplos:

  • O dia está ensolarado.
  • Eles são engenheiros.

Nesses casos, o verbo ser não rege complementos, mas estabelece uma relação entre o sujeito e o predicativo.

2. Verbo “ser” em expressões de tempo

O verbo ser também é amplamente utilizado em expressões de tempo, especialmente para indicar horas, datas e períodos. Quando usado dessa forma, ele é impessoal e compõe uma oração sem sujeito ou de sujeito inexistente:

Exemplos:

  • É meio-dia.
  • São três horas.
  • Era outono quando nos conhecemos.

Aqui, a regência é marcada pela ausência de complementos regidos diretamente pelo verbo. Afinal, ele apenas introduz uma ideia temporal, frequentemente acompanhada de adjuntos adverbiais.

3. Verbo “ser” em construções existenciais

Embora menos frequente, o verbo ser pode aparecer em construções existenciais, especialmente em registros mais antigos ou formais. Nesses casos, ele atua como equivalente a “haver” ou “existir”.

Exemplo:

  • Era uma vez uma menina em um vilarejo distante.

Nesse tipo de construção, o verbo ser é impessoal e não rege diretamente complementos verbais, mas participa da formação de um contexto narrativo.

4. Verbo “ser” em construções predicativas com preposições

Em alguns contextos, o verbo ser pode ser seguido de preposições para indicar pertencimento, origem ou destino. Nesse caso, ele se associa a predicativos preposicionados:

Exemplos:

  • Este livro é de Maria.
  • O presente era para João.
  • O vinho é de Portugal.

A preposição desempenha um papel crucial na construção do significado, conectando o predicativo ao verbo de maneira mais específica. Note, dessa forma, que ela varia conforme o sentido atribuído ao verbo na oração.

5. Verbo “ser” em comparações

Em construções comparativas, o verbo ser é frequentemente utilizado para estabelecer relações de igualdade, superioridade ou inferioridade. Nesse sentido, essas estruturas podem incluir termos regidos por preposições, como “como” ou “que”:

Exemplos:

  • Ele é como um irmão para mim.
  • Este carro é melhor que aquele.

Nesses casos, o verbo rege estruturas preposicionais ou subordinadas que expressam a comparação.

6. Voz passiva composta com “ser”

O verbo ser também é um auxiliar essencial na formação da voz passiva. Nessa função, ele acompanha o particípio de um verbo principal para indicar que o sujeito sofre a ação verbal:

Exemplos:

  • O relatório foi entregue ontem.
  • As portas serão abertas às 9h.

Aqui, o verbo principal é quem determina a regência. No entanto, é fundamental observar que o verbo ser contribui para a formação do significado ao transformar o objeto direto da ativa no sujeito da passiva.

7. Verbo “ser” em contextos filosóficos e existenciais

Em contextos mais abstratos, como em textos filosóficos ou literários, o verbo ser pode carregar um peso semântico mais significativo, muitas vezes aproximando-se do significado de “existir”. Em tais usos, a regência é amplamente determinada pelo contexto, e o verbo pode ser seguido por expressões que enfatizam o estado de ser ou existir.

Exemplos:

  • Ser ou não ser, eis a questão.
  • O que é a verdade?

8. Evolução da regência do verbo “ser”

Como outros verbos da língua portuguesa, a regência de ser também passou por mudanças ao longo do tempo. Em registros arcaicos, encontramos construções que hoje seriam consideradas inadequadas ou estilisticamente marcadas. Por exemplo, o uso de ser com certas preposições para marcar relações que hoje são expressas de outras maneiras.

Exemplo arcaico:

  • Ele é em quem confiamos.
    (Atualmente: Ele é aquele em quem confiamos.)

Classificação do verbo “ser”

O verbo “ser” é classificado como verbo anômalo devido às suas múltiplas irregularidades nas conjugações ao longo dos tempos verbais.

Essa classificação se deve ao fato de ele apresentar formas que derivam de radicais distintos, como “sou” (presente do indicativo), “era” (pretérito imperfeito) e “fui” (pretérito perfeito), além de “seja” (presente do subjuntivo). Essas variações não seguem um padrão uniforme, diferentemente dos verbos regulares.

Concordância com o verbo “ser”

Para complementar seus estudos, preparamos abaixo uma tabela com todos os casos de concordância com o verbo “ser”:

SituaçãoConcordância do Verbo “Ser”Exemplo
Sujeito e predicativo são nomesO verbo concorda com o sujeito ou o predicativo, dependendo do contexto.A causa são os descuidos.
Sujeito é pronome pessoalO verbo concorda com o pronome pessoal.Eles são amigos de longa data.
Sujeito é “tudo” ou “nada”O verbo concorda no singular.Tudo é ilusão.
Sujeito é um dos pronomes “isso”, “aquilo”, “isto”O verbo concorda no singular.Isso é problema seu.
Horas, datas e distânciasO verbo concorda com o número que indica as horas, a data ou a distância.São três horas. / Hoje são 15 de março.
Expressão indicativa de quantidadeO verbo concorda com o predicativo.Cinco metros é o suficiente.
Expressões fixas (como “é muito”, “é pouco”)O verbo permanece no singular.É muito para mim.

A concordância do verbo “ser” pode variar conforme a ênfase e o contexto, o que exige atenção às regras específicas para garantir precisão no uso.

Referência

Dicionário Prático de Regência Verbal, Celso Pedro Luft.