Ele deve ter estudo muito, porque passou nas primeiras posições do concurso.
Ele foi aprovado, porque está na lista de convocados para a próxima fase.
Embora nos dois períodos acima as orações sejam conectadas pelo vocábulo “porque“, a conjunção tem valores semânticos distintos nas duas frases. Na primeira, ela é coordenativa explicativa; na segunda, subordinativa causal.
Neste artigo, você vai entender de uma vez por todas como diferenciar essas duas funções do “porque” de forma prática, rápida e eficiente. Confira!
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ToggleCausa real x Causa de dicto
Antes de avançarmos, um aviso importante. Essa explicação inicial pode parecer um pouco complexa, mas ela vai dar bem mais clareza sobre quando a conjunção porque é causal e quando é explicativa. Então, aguenta firma e vamos juntos!
A conjunção causal indica a chamada causal real. Em contrapartida, a conjunção explicativa expressa a chamada causa de dicto. Vamos entender melhor a diferença entre esses dois conceitos.
Causa de dicto
Trata-se de uma expressão em Latim que pode ser traduzida como “motivo da afirmação”. Nesse sentido, ela em geral:
- Refere-se à justificativa ou explicação que alguém dá a uma afirmação.
- Pode ser subjetiva ou baseada em crenças interpretações ou argumentos falhos.
- Nem sempre corresponde à realidade dos fatos.
Causa real
Causa real, por sua vez, é a causa de fato e de direto. Por isso, ela:
- Representa o motivo verdadeiro e objetivo de um fenômeno, independente da explicação dada.
- Pode ser investigada por meio de fatos, evidências e raciocínio lógico.
Modalizadores
Diante dessas informações, podemos afirmar que a causa é objetiva e a explicação é subjetiva. Grave isso! É muito importante!
Por ser subjetiva, a explicação é opinativa e pode ser representada pela expressão “deduz-se que”. Além disso, ela frequentemente vem acompanhada pelos chamados modalizadores, que são palavras ou expressões que indicam o ponto de vista do falante.
Eles podem ser advérbios (talvez, certamente, evidentemente, etc), verbos auxiliares modais (dever, pretender, poder, suspeitar, etc.), expressãoes (na minha opinião, é possível que, etc) dentre outros.
Vejamos alguns exemplos:
- Marisa pode ter sido reprovada, porque não teve tempo de estudar.
- Na minha opinião, você não estudou o suficiente, porque foi a todas as festas que podia.
- Suspeito que haja um vazamento na casa, porque a conta de água aumentou demais.
Nos três exemplos acima, podemos introduzir a expressão “deduz-se que“. Isso indica que estamos diante de uma opinião e, assim, de uma conjunção explicativa:
- Deduz-se que Marisa pode ter sido reprovada, porque não teve tempo de estudar.
- Deduz-se que você não estudou o suficiente, porque foi a todas as festas que podia.
- Deduz-se que haja um vazamento na casa, porque a conta de água aumentou demais.
Causal: Antes-Depois
Quando estamos diante de uma relação causal, a oração introduzida pelo porque trará uma causa e a oração principal tratá uma consequência. Afinal, toda causa tem uma consequência. É uma relação lógica e verivicável. Por isso, é objetiva e incontestável.
E atenção! A causa sempre acontece antes da consequência. Sempre!
Ademais, uma dica que pode ajudar é que, nas orações causais, podemos utilizar o esquema “o fato de (causa) fez com que (consequência)“.
Para entender melhor, vamos conferir um exemplo:
- Não fomos ao baile, porque estava chovendo.
Percebeu que não ter ido ao baile é uma consequência de estar chovendo. Logo, a chuva é a causa da não ida ao evento. Ademais, note que primeiro veio a causa (chuva) e depois a consequência (não ir ao baile).
Agora, vejamos a frase usando o esquema que falamos acima:
- O fato de estar chovendo fez com que não fóssemos ao baile.
Para reforçar, vamos ver mais um caso:
- Meu pai não comprou a casa, porque o financiamento não foi aprovado.
Novamente, estamos diante de uma relação objetiva. Como o financiamento não foi aprovado (causa), meu pai não pôde adquirir o imóvel (consequência).
Para deixar ainda mais claro, vamos novamente usar nosso esquema:
- O fato de o financiamento não ter sido aprovado fez com que meu pai não comprasse a casa.
Em resumo: se a oração principal expressar uma consequência da subordinada, a conjunção porque é causal; se não, é explicativa.
Coordenada x Subordinada
Outro ponto importante para diferenciar as conjunções causais das explicativas é entender que as primeiras introduzem oração subordinadas adverbiais e as segundas orações coordenadas. Isso tem algumas implicações práticas. Vejamos!
Iniciar frases
As conjunções coordenativas, em regra, não podem ser usadas no início da oração. Portanto, se o porque estiver no começo da frase, ele só pode ser causal:
- Porque choveu muito ontem, Paulo não veio trabalhar.
Substituir por pontuação
As orações coordenadas podem ser assindéticas (sem conjunção). Nesse contexto, conjunções coordenativas, em geral, podem ser substituídas por vírgula, dois-pontos ou travessão:
- Deve ter havido algum problema, porque Jorge não chegou até agora.
- Deve ter havido algum problema, Jorge não chegou até agora.
- Deve ter havido algum problema: Jorge não chegou até agora.
- Deve ter havido algum problema – Jorge não chegou até agora.
Imperativo
Semanticamente, a explicação é utilizada para suavisar uma imposição ou uma obrigação. Por isso, sempre que uma das orações tiver verbo no imperativo ou expressão que indique ordem, conselho ou direcionamento, a conjunção porque será sempre explicativa:
- Estude o máximo que puder, porque os concorrentes estão muito bem preparados.
- É importante dominar a matéria de Língua Portuguesa, porque ela tem peso 2.
- Você deve começar a estudar o quanto antes, porque o dia da prova está chegando.
Vírgula com “porque” explicativo e causal
Por fim, é fundamental destacar que quando a conjunção porque for explicativa, a relação que se estabelece é a de coordenação. Dessa forma, a vírgula é obrigatória.
Por outro lado, quando é causal, a relação é de subordinação. Por isso, a vírgula é facultativa ou opcional.
Resumo
Uma observação importante: as regras para diferenciar quando a conjunção porque é explicativa e quando é causal valem para outros conectivos como “pois”, “já que”, “uma vez que”, dentre outros.
Para ajudá-lo a fixar as regras descritas neste artigo, preparamos a tabela abaixo:
Critério | Porque Explicativo | Porque Causal |
Valor Semântico | Justifica uma afirmação anterior. | Indica uma relação objetiva de causa e consequência. |
Causa Real vs. Causa de Dicto | Expressa uma justificativa ou explicação subjetiva, podendo não refletir a realidade dos fatos. | Representa um fato real e verificável, podendo ser comprovado por evidências. |
Modalizadores | Presença frequente de palavras que indicam opinião, como advérbios (talvez, certamente), verbos modais (suspeito, deve) e expressões (na minha opinião). | Não há necessidade de modalizadores; a afirmação tem base lógica e objetiva. |
Relação de Causa e Consequência | Não expressa uma relação clara de antes-depois entre causa e consequência. | A causa sempre ocorre antes da consequência. |
Posição na frase | Não pode iniciar frases. | Pode iniciar frases sem problemas. |
Substituição por pontuação | Pode ser substituído por vírgula, dois-pontos ou travessão. | Não pode ser substituído por pontuação. |
Verbo no imperativo | Frequentemente aparece quando há uma ordem, conselho ou direcionamento. | Não aparece em frases com verbo no imperativo. |
Uso de vírgula | Vírgula é obrigatória, porque é uma conjunção coordenativa. | A vírgula é opcional, já que a relação é de subordinação. |
Questões de concurso sobre “porque” explicativo e causal
Para fechar este artigo, vamos conferir duas questões de concursos sobre o uso da conjução porque causal e explicativa para entender como as bancas cobram o tema. Vejamos!
Questão 1 – IDECAN – 2019 – IF-PB – Professor – Língua Portuguesa
Observe o trecho abaixo:
[…]
e muda porque com nenhuma comunica,
porque cortou-se a sintaxe desse rio,
o fio de água por que ele discorria
[…] (linhas 10 a 12)
Pode-se afirmar que as palavras destacadas funcionam, respectivamente, como
a) conjunção causal e pronome relativo regido por preposição.
b) conjunção explicativa e causal.
c) conjunção integrante e conjunção coordenativa.
d) conjunção causal e explicativa.
e) conjunção explicativa e locução prepositiva.
Resposta: Letra A.
Comentário:
Vamos analisar a frase por partes para entender as funções dos termos destacados.
- e muda porque com nenhuma comunica, porque cortou-se a sintaxe desse rio
Aqui temos uma relação de causa e consequência. Primeiro, cortou-se a sintaxe do rio, depois ele mudou e parou de se comunicar.
Logo, estamos diante de uma conjunção causal. Para nos certificar disso, podemos usar nosso esquema:
- O fato de terem cortado a sintaxe desse rio fez com que ele mudasse e com nenhuma se comunicasse.
Agora vejamos o trecho com a segunda expressão destacada:
- o fio de água por que ele discorria
Nesse ponto, temos o encontro do pronome relativo “que”, retomando a expressão “fio de água”, e da preposição “por”.
Para confirmar esse entendimento, basta substituir “por que” por “pelo qual”.
- o fio de água pelo qual ele discorria
Questão 2 – Questão 2 – Avança SP – 2025 – Prefeitura de Caieiras – SP – Agente de Limpeza Pública
Analise a relação de sentido estabelecida pelas conjunções em negrito e o termo entre parênteses. Destaque a relação incorreta.
a) Como não tinha aptidão para a música, vendeu seu violão. (conformidade)
b) Por mais que esteja atrasado, esperarei por você. (concessão)
c) Esvaziou suas economias, porque estava endividado (explicação)
d) Seus olhos fecham-se sempre que está com medo. (tempo)
e) Caso não termine o trabalho, avise-me. (condição)
Resposta: Letra A
Comentário:
Vou comentar rapidamente a alternativa correta. Em geral, quase sempre a conjunção “como” no início das frases tem valor causal. Ela só tem valor conformativo quando pode ser substiuída por “conforme” ou “da mesma forma que”.
Agora vamos analisar a frase da letra C, que está ligada ao tema do nosso artigo:
- Esvaziou suas economias, porque estava endividado (explicação)
Note que a frase expressa uma opinião ou uma hipótese. Para verificar isso, podemos usar a expressão “deduz-se que”:
- Deduz-se que esvaziou suas economias, porque estava endividado.
Além disso, como vimos, na causalidade real, o evento causal acontece antes da consequência. Aqui, a frase não evidencia essa sequência temporal de forma lógica e incontestável.
Se a ideia fosse passar uma ideia de causa, a frase poderia ser reescrita de forma mais direta e objetiva:
- Esvaziou suas economias, porque precisava pagar as dívidas.
Aqui sim temos uma relação lógica e clara de antes-depois.
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Confira a aula completa sobre quando a conjunção “porque” é causal ou explicativa: