Carlos Drummond de Andrade foi contista, cronista e poeta e fez parte da segunda geraรงรฃo do modernismo brasileiro. Considerado um dos maiores escritores do Brasil, Drummond escreveu diversos poemas de versos livres e ainda obras caracterizadas pelas temรกticas do cotidiano e crรญtica sociopolรญtica. Alรฉm disso, foi precursor da โPoesia 30โ, por meio da obra intitulada como: โAlguma Poesiaโ.
Quem foi Carlos Drummond de Andrade?
Carlos Drummond de Andrade nasceu em 31 de outubro de 1902, em Itabira, interior de Minas Gerais. Nono filho do casal de fazendeiros Carlos de Paula Andrade e Julieta Augusta Drummond de Andrade, Drummond iniciou na escola no ano de 1910.
Desde pequeno, o escritor jรก demonstrava interesse pela literatura e, em 1916, ingressou no Colรฉgio Arnaldo, em Belo Horizonte. Em 1918, Drummond foi estudar no Colรฉgio Anchieta, em Nova Friburgo, no Rio de Janeiro, como interno. No entanto, foi expulso no final do ano de 1919 devido a um desentendimento com o seu, entรฃo, professor de portuguรชs.
Em razรฃo disso, o escritor e sua famรญlia retornaram a Belo Horizonte no ano seguinte e, em 1921, Drummond publicou os seus primeiros textos no Diรกrio de Minas. Em 1922, o seu conto intitulado de โJoaquim do telhadoโ foi premiado em um concurso literรกrio.
Jรก em 1923, Carlos passou no vestibular e se matriculou na Escola de Odontologia e Farmรกcia de Belo Horizonte. Dois anos depois, em 1925, se casou com Dolores Dutra de Morais, e teve dois filhos, sendo Carlos Flรกvio, que viveu apenas meia hora e Maria Julieta, nascida em 1928. Formou-se no curso de Farmรกcia, porรฉm nรฃo exerceu a profissรฃo.
No ano de 1926, ministrou aulas de Portuguรชs e Geografia em Itabira e depois, decidiu voltar a Belo Horizonta, onde passou a trabalhar como redator-chefe no Diรกrio de Minas. Dois anos mais tarde, publicou um de seus trabalhos mais famosos, o poema โNo meio do Caminhoโ, na Revista Antropofagia, considerado um dos maiores escรขndalos literรกrios da รฉpoca,
Em 1929, deixou o cargo no Diรกrio de Minas e assumiu a redaรงรฃo no Minas Gerais. Continuou com a sua escrita literรกria e em 1930 publicou o seu primeiro livro: โAlguma Poesiaโ.
Drummond e os cargos no gabinete
No ano de 1930, Carlos Drummond foi contratado para o cargo de gabinete do entรฃo secretรกrio do Interior, em Minas Gerais, Gustavo Capanema. Assim, em 1935, quando Gustavo se tornou ministro da Educaรงรฃo e Saรบde Pรบblica, Carlos Drummond se mudou para o Rio de Janeiro, ocupando o cargo de chefe de gabinete do novo ministro durante o governo de Getรบlio Vargas.
Segundo o pesquisador Lucas Eduardo de Souza Ferreira, a chegada de Drummond ao Ministรฉrio da Educaรงรฃo fazia parte de um movimento do Governo Vargas para angariar os intelectuais modernistas das mais variadas vertentes (Oscar Niemeyer, Cรขndido Portinari, Heitor Villa-Lobos entre outros) para o funcionalismo pรบblico.
Essa estratรฉgia visava reforรงar uma visรฃo nacionalista de paรญs idealizada pelo Estado Novo e utilizar esses รญcones da cultura brasileira como porta-vozes da naรงรฃo.
Vale destacar que, tempos depois, Drummond deixou o Governo Vargas e se filiou ao Partido Comunista Brasileiro e foi lanรงado como candidato a deputado federal. A candidatura, porรฉm, nรฃo prosperou. Em seu diรกrio da รฉpoca, publicado nos anos 1980, Drummond conta que recebeu um convite para se candidatar, mas recusou. Neste caso, seu nome teria sido usado ร revelia pelo partido โ tese que nรฃo agrada aos antigos companheiros de legenda.
Jornalismo
Em paralelo ร sua atuaรงรฃo como funionรกrio pรบblico, Drummond escreveu periรณdicos para a Revista Acadรชmica, Euclides, Correio da Manhรฃ, A Manhรฃ e Folha Carioca. Jรก em 1945, deixou o atual trabalho e assumiu o jornal comunista Tribuna Popular. Apรณs isso, foi trabalhar na diretoria do Patrimรดnio Histรณrico e Artรญstico Nacional (DPHAN).
De 1949 atรฉ 1953, Drummond escreveu para o Minas Gerais e, nove anos depois, no ano de 1962, se aposentou como chefe de seรงรฃo da DPHAN. A partir disso, continuou a colaborar com os periรณdicos e publicou diversos livros.
Premiaรงรตes e homenagens recebidas
Durante toda a sua vida, o escritor recebeu diversas premiaรงรตes. Dentre as principais, destacam-se:
- Prรชmio da Sociedade Felipe dโOliveira, em 1946;
- Prรชmio Padre Ventura, em 1959 e 1952;
- Prรชmio Luisa Clรกudio de Souza, em 1963;
- Prรชmio Jabuti, em 1968;
- Prรชmio de Poesia da Associaรงรฃo Paulista de Crรญticos Literรกrios, em 1973;
- Prรชmio Nacional Walmap de Literatura, em 1975;
- Prรชmio Estรกcio de Sรก, em 1980.
No ano de 1982, Drummond recebeu o tรญtulo de doutor honoris causa, pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, a UFRN.
O poeta foi muito homenageado em sua vida. Algumas dessas homenagens estรฃo nas cidades de Porto Alegre, com a estรกtua โDois Poetasโ e na praia de Copacabana, com a estรกtua โO Pensadorโ.
Drummond tambรฉm foi homenageado com o documentรกrio โO poeta de sete facesโ no ano de 2002, o qual retrata a vida e a obra do escritor. Alรฉm disso, entre os anos de 1988 e 1990, a imagem do escritor foi representada nas notas de cinquenta cruzados.
Falecimento de Carlos Drummond de Andrade
Carlos Drummond faleceu no dia 17 de agosto de 1987, no Rio de Janeiro. O poeta estava com a saรบde debilitada desde o final do ano de 1986, quando sofreu um infarto. Drummond acompanhou de perto o cรขncer e a morte de sua รบnica filha, Maria Julieta, e morreu poucos dias depois dela.
O laudo mรฉdico indicou insuficiรชncia respiratรณria como causa da morte. No entanto, familiares e amigos relataram que o escritor โmorreu de desgostoโ.
Principais obras de Carlos Drummond de Andrade
As obras de Carlos Drummond de Andrade apresenta caracterรญsticas de crรญticas sociopolรญticas, temรกticas do cotidiano, universalismo e conflito existencial. Alรฉm disso, sรฃo, em sua maioria, versos livres com traรงos regionalistas. Dentre as principais obras, destacam-se:
Livros
- Sentimento do Mundo
- A Bolsa e a Vida
- Alguma Poesia
- Antologia Poรฉtica
- As Impurezas do Branco
- Boca de Luar
- De Notรญcias e Nรฃo Notรญcias Faz-se a Crรดnica
- Contos Plausรญveis
- Claro Enigma
- O Gerente
Principais poemas
No Meio do Caminho
No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.
Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tรฃo fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.
Poema de Sete Faces
Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.
As casas espiam os homens
que correm atrรกs de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
nรฃo houvesse tantos desejos.
O bonde passa cheio de pernas:
pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus,
pergunta meu coraรงรฃo.
Porรฉm meus olhos
nรฃo perguntam nada.
O homem atrรกs do bigode
รฉ sรฉrio, simples e forte.
Quase nรฃo conversa.
Tem poucos, raros amigos
o homem atrรกs dos รณculos e do bigode.
Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu nรฃo era Deus
se sabias que eu era fraco.
Mundo mundo vasto mundo,
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, nรฃo seria uma soluรงรฃo.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto รฉ meu coraรงรฃo.
Eu nรฃo devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo.
Quadrilha
Joรฃo amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili,
que nรฃo amava ninguรฉm.
Joรฃo foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que nรฃo tinha entrado na histรณria.
Josรฉ
E agora, Josรฉ?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, Josรฉ?
e agora, vocรช?
vocรช que รฉ sem nome,
que zomba dos outros,
vocรช que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, Josรฉ?
Estรก sem mulher,
estรก sem discurso,
estรก sem carinho,
jรก nรฃo pode beber,
jรก nรฃo pode fumar,
cuspir jรก nรฃo pode,
a noite esfriou,
o dia nรฃo veio,
o bonde nรฃo veio,
o riso nรฃo veio,
nรฃo veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, Josรฉ?
E agora, Josรฉ?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerรชncia,
seu รณdio โ e agora?
Com a chave na mรฃo
quer abrir a porta,
nรฃo existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas nรฃo hรก mais.
Josรฉ, e agora?
Se vocรช gritasse,
se vocรช gemesse,
se vocรช tocasse
a valsa vienense,
se vocรช dormisse,
se vocรช cansasse,
se vocรช morresse…
Mas vocรช nรฃo morre,
vocรช รฉ duro, Josรฉ!
Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
vocรช marcha, Josรฉ!
Josรฉ, para onde?
Prosa e Crรดnicas
- “Confissรตes de Minas
- Contos de aprendiz
- Passeios na ilha
- Fala, amendoeira
- A bolsa & a vida
- A minha vida
- Cadeira de balanรงo
- Caminhos de Joรฃo Brandรฃo
- O poder ultrajovem e mais 79 textos em prosa e verso
- 70 historinhas
- Contos plausรญveis
- Boca de luar
- O observador no escritรณrio
- Moรงa deitada na grama
- O avesso das coisas
- Autorretrato e outras crรดnicas
Outras curiosidades sobre Carlos Drummond de Andrade
Para fechar este artigo, trazemos trรชs curiosidades sobre a vida de Drummond:
- O escritor tem uma das estรกtuas mais populares do Rio de Janeiro. O monumento, que fica no calรงadรฃo de Copacabana, no Posto 6, tornou-se um dos principais pontos turรญsticos da cidade. A peรงa foi inaugurada em 2002, pesa 150kg e รฉ feita de bronze.
- Entre marรงo de 1989 e setembro de 1992, o rosto de Drummond e seu poema “Canรงรฃo Antiga” estaparam a nota de 50 cruzados novos.
- Em 1969, Drummond traduziu 5 mรบsicas dos Beatles para a revista “Realidade“. A matรฉria falava sobre o livro-biografia da banda, escrito por Hunter Davies. As canรงรตes, que faziam parte do รกlbum Branco da banda inglesa, eram: โOb-La-Di, Ob-La-Daโ, โPiggiesโ, โWhy don’t we do it in the road?โ, โI Willโ, โBlackbirdโ e โHappiness is a warm gunโ.