Entre as fases pelas quais toda criança passa até se tornar apta a escrever, a hipótese silábica é a virada de chave, o momento “mágico” no qual uma criança afinal descobre que a escrita é a representação da fala e que os sons podem ser representados por letras e sílabas.

É, portanto, um divisor de águas que confere à criança um primeiro amadurecimento educacional.

Por que dizemos isso? Se você já teve a oportunidade de conviver com uma criança ainda não alfabetizada e pôde observar como ela se comunica, certamente percebeu o interesse dela e o esforço em se conectar, ainda que aleatoriamente, a palavras escritas.

Ao desenvolverem seus estudos sobre a psicogênese da língua escrita, Emília Ferreiro e Ana Teberosky, detectaram que as crianças criam teorias (hipóteses) ao longo do processo de alfabetização. Elas explicam que, mesmo antes de conseguir escrever de próprio punho os primeiros bilhetes para a mãe, toda criança cria hipóteses mentais sobre (o mistério de) como é se comunicar pela palavra escrita.

Não raro ela produz “garranchos” e, se a convidarmos a dizer o que “escreveu”, certamente virá com uma resposta “direta e clara” de algo que só ela mesma pode identificar. A comunicação ainda não se dá pela escrita, mas sim pela fala.

Essa ideia é essencial para perceber que a criança pensa sobre a escrita antes mesmo de ingressar na escola e, de algum modo, inicia autonomamente o seu próprio caminho rumo à alfabetização.

Quais são as fases da alfabetização?

Segundo Ferreiro e Teberosky, o começo disso tudo parte da ideia mais simples – a hipótese pré-silábica –, que é a fase dos garranchos e desenhos aleatórios: a criança ainda não consegue fazer correspondências entre o que é falado e escrito. Depois, ela avança para a hipótese silábica, para a silábico-alfabética e, então, para a alfabética.

A hipótese silábico-alfabética corresponde mais à transição entre as hipóteses silábica e alfabética, que é quando a escrita representa cada fonema com uma letra e, enfim, a criança entende a lógica do funcionamento do sistema de escrita.

O que acontece na hipótese silábica?

Na hipótese silábica, a criança abandona os grafismos e passa a entender que há uma relação termo a termo entre sons e escrita. Ela começa a atribuir uma grafia a cada parte falada (a sílaba oral) e a fazer relações entre a quantidade de sílabas de uma palavra e os sons emitidos na fala, embora muitas vezes as letras escolhidas não sejam aquelas que correspondem exatamente aos sons emitidos – a isso se dá o nome de hipótese silábica sem valor sonoro.

Para a educadora Janaina Spolidorio, essa criança, embora consiga perceber que a escrita é a representação da fala e atribuir uma letra por sílaba, mantém um pé na hipótese anterior, por não perceber ainda que a cada letra se atribui um valor sonoro convencional.

É, portanto, como se essa criança em hipótese silábica sem valor sonoro estivesse presa no meio da transição entre o pré-silábico e o silábico. Ela até percebe que a palavra COMIDA tem três sílabas, mas vai escrever, por exemplo, BEJ, atribuindo para cada sílaba uma letra que não tem qualquer relação com o som original.

Nessa etapa, é de se esperar que a criança busque essa correspondência, ou seja, que atribua valor sonoro às letras, mesmo que o mais comum, nesse momento, seja vê-la identificar cada emissão sonora (sílaba) com apenas uma letra. É o que explica ela grafar algo como OMA, ou CIA, se a intenção é escrever COMIDA, ou seja, a criança deve procurar usar letras que lhe sejam familiares para corresponder a cada som (sílaba).

Há também crianças com dificuldade de avançar para a próxima “casinha”. Segundo Janaina Spolidorio, não é incomum ter aquelas que se sintam satisfeitas com o que conquistaram na hipótese silábica e acabam estacionando em sua evolução. Para estas, o importante é ajudá-las a ampliar o vocabulário por meio de exercícios de consciência fonológica, assunto que já vimos por aqui.

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