Níveis de escrita: pré-silábico, silábico, silábico-alfabético, alfabético e ortográfico

Com a ajuda da teoria de Piaget, que demonstrou de forma mais clara como o ser humano adquire conhecimentos desde seu nascimento, a psicóloga e pesquisadora Emília Ferreiro desenvolveu uma teoria sobre como o indivíduo aprende a escrever e suas fases, por meio dos níveis de escrita: pré-silábico, silábico, silábico-alfabético, alfabético e ortográfico.

Ferreiro afirmou que, mesmo antes de a criança ir para a escola, já há um aprendizado da escrita, ainda que, no começo, seja apenas uma representação e somente nas fases seguintes passe a ser codificada para a língua materna.

Neste artigo, vamos conceituar o que são os níveis de escrita, quais são suas características predominantes e também abordar a apreensão de conhecimentos por adolescentes e adultos, além de comentar sobre o impacto da tecnologia na aprendizagem de uma forma geral. Vamos lá!

Resumo dos níveis de escrita

Os níveis de escrita e as fases pelas quais as crianças passam antes da alfabetização e letramentos completos são fundamentais para perceber que o estímulo é parte fundamental de qualquer um dos níveis.

Cada um tem sua importância, e não pular etapas é fundamental para um aprendizado constante e regular. Os aprendizes passam por quatro diferentes fases, que vão dos rabiscos à escrita formal, mas em todas são passadas diferentes hipóteses e explicações sobre como a escrita funciona.

Nível de escritaCaracterísticasIdade
Pré-Silábico1) Uso de garatujas que imitam a escrita adulta, mas sem correspondência com sons específicos.
2) Representação de palavras com desenhos ou símbolos.
3) Falta de compreensão de que letras representam sons (falta de compreensão entre a relação de letra e fonema)
3 a 4 anos
Silábico1) Cada símbolo (letra) representa uma sílaba pronunciada, não necessariamente correspondendo ao som real.
2) Início do entendimento de que a escrita é uma representação da fala.
3) Uso limitado de letras, normalmente vogais ou consoantes que representam as sílabas mais sonoras da palavra.
5 a 6 anos
Silábico-Alfabético1) Combinação de elementos do nível silábico e alfabético, na qual sílabas são representadas corretamente enquanto outras são simplificadas.
2) A criança começa a compreender que as sílabas podem ser compostas por mais de uma letra.
3) Ainda há inconsistências na representação de letras nas sílabas.
6 a 7 anos
Alfabético1) Representação correta de todas as sílabas com suas respectivas letras.
2) Compreensão de que cada fonema (som) pode ser representado por letras específicas.
3) Habilidade para escrever palavras de acordo com regras ortográficas básicas, mesmo que com alguns desvios.
7 anos
Ortográfico1) Aplicação correta das regras de acentuação e ortografia, inclusive em palavras de ortografia irregular.
2) Uso consistente das convenções gramaticais, como a pontuação e a separação de sílabas, em textos.
3) Capacidade de identificar e corrigir erros ortográficos de forma autônoma em sua escrita.
8 a 10 anos
Quadro-resumo – níveis de escrita

O que são níveis de escrita?

Os níveis de escrita são as diferentes fases pelas quais uma criança passa, até mesmo antes de ir para a escola, em que começa a se familiarizar com a escrita e a relacionar letras com palavras e fonemas.

São quatro os níveis de escrita, e neste artigo vamos descrever cada uma dessas etapas que todo indivíduo vive até que consiga se comunicar de forma escrita regularmente.

Conceito de alfabetização e letramento

Para que seja possível compreender de forma mais clara os níveis de escrita, primeiro vamos explicar os conceitos de alfabetização e letramento, pois, apesar de serem diferentes, um está intimamente ligado ao outro.

O processo de alfabetização é o que podemos chamar de desenvolvimento das competências de leitura e escrita, onde se decodificam os elementos que são responsáveis por compor a escrita.

E, no caso do letramento, ele vai um pouco além, pois consiste no domínio da língua, posterior à alfabetização. Ocorre quando o indivíduo é capaz de obter informações por meio da leitura e aproveitar esse aprendizado aplicando-o a práticas sociais.

Psicogênese da língua escrita

A definição dos níveis de escrita foi o resultado de uma pesquisa sobre a psicogênese da língua escrita. Psicogênese é a origem e o desenvolvimento de processos psicológicos e mentais.

É sabido que a alfabetização e o contato com a leitura e a escrita são grandes passos na aprendizagem das crianças, e a psicogênese ampliou a visão sobre esses processos, para que eles possam ir muito além de métodos convencionais.

Foram descobertas falhas de rendimento em crianças em fase de alfabetização, e concluiu-se que, antes de os alunos desenvolverem a compreensão do alfabeto, já haviam construído algumas hipóteses sobre a escrita, e, por isso, a aprendizagem não pode ser feita de forma mecânica.

Importância do desenvolvimento gradual

É extremamente importante que cada passo seja dado de acordo com o que foi estabelecido em cada fase da escrita, respeitando os níveis e a capacidade das crianças de apreender cada etapa.

Assim, torna-se possível passar pelas diferentes hipóteses e explicações, de acordo com a teoria da psicogênese elaborada por Ferreiro e Teberosky.

Quais são os 5 níveis da escrita na infância? 

Vejamos neste tópico os quatro níveis de escrita que começam a se desenvolver desde a mais tenra idade:

Nível pré-silábico: desenhos e rabiscos de letras

O nível pré-silábico é o momento em que a criança dá início ao seu processo de distinguir desenhos de escrita. Nesse nível, o primeiro dos quatro níveis, ela ainda não conhece bem o alfabeto, mas consegue perceber que o que está escrito representa suas falas, ainda que só consiga fazer desenhos simples e rabiscos.

Como não conhece todas as letras, as crianças tendem a usar a primeira letra das palavras para escrevê-las de forma linear, mesmo que use formas diferentes de escrita, com critérios quantitativos, variando a quantidade de letras para realizar diferentes escritas, ou qualitativos, para variar o repertório de letras sem mudar a quantidade.

Nessa fase, a criança apresenta leitura global, individual e estável do que escreve; somente ela sabe o que quis escrever. Mas não há ainda relação entre fala e escrita, podendo usar números e letras na construção das palavras.

Confira abaixo dois exemplos (nível 2 e nível 1) de escrita pré-silábica:

Níveis de escrita: pré-silábico nível 2
Fonte: Fundação Cecierj
Níveis de escrita: pré-silábico nível 1
Fonte: Fundação Cecierj

Nível silábico: correspondência e organização

O segundo momento dos níveis de escrita é o silábico, em que já sugere formas de diferenciação e organização da sua escrita. Nesse momento, ela apreende mais sobre as letras e já sabe como organizá-las nas palavras para que representem algo.

Mas esse conhecimento não é transmitido por adultos, e é uma conquista pessoal muito especial para as crianças, já que, nessa fase, ela se espelha nos mais velhos e já começa a comparar o que eles escrevem com o que já sabe.

Nesse estágio, a criança passa a entender que o que se escreve está relacionado com o que se fala, e começa a buscar explicações para compreender melhor o sistema de representação, separando oralmente as palavras e buscando correspondência em suas grafias.

Há a percepção de que fala e letras são correspondentes, mesmo que ainda não consiga interligar letras e sons. Nesse momento, é possível também perceber que as sílabas são as menores unidades da língua.

Confira abaixo um exemplo de escrita silábica:

Níveis de escrita: silábico.
Fonte: Fundação Cecierj

Nível silábico-alfabético: relacionando sílabas e letras

Já no nível silábico-alfabético, a criança percebe que as sílabas que fala possuem mais de uma letra e passa então a realizar combinações de vogais e consoantes em uma mesma palavra, buscando combinar sons e percebendo que a escrita representa o som do que se fala.

Começa também a desenvolver a capacidade de realizar pequenas leituras, de fácil composição. Nesse período, a criança percebe que sua forma de escrever ainda não é a correta, e esse quadro pode evoluir, com a busca de mais conhecimento, ou involuir, e ela volta a escrever letras de forma aleatória.

Como é uma fase de transição, é possível que a criança passe a escrever algumas sílabas e, ao mesmo tempo, tenha dificuldade em compreender tantas outras.

Confira abaixo um exemplo de escrita silábico-alfabética:

Níveis de escrita: nível silábico-alfabético.  Fonte: Fundação Cecierj
Fonte: Fundação Cecierj

Nível alfabético: reprodução dos fonemas

No último nível de escrita, o alfabético, a criança já é capaz de perceber o valor de letras e sílabas. Na escola, já é possível que ela comece a reproduzir de forma correta os fonemas de uma palavra, ligando em definitivo fala e escrita.

Ela já percebe o modo de construção do código da escrita e se torna capaz de compreender que uma mesma sílaba pode ser composta por uma, duas ou três letras, apesar de ainda aparentar certa dificuldade em fazer a separação das palavras ao tentar escrever um texto.

Já há a compreensão da função social da escrita, mas sem que seja completamente léxica ou ortográfica. Podemos perceber que todas essas fases são fundamentais para o pleno desenvolvimento.

Níveis de escrita: alfabético
Fonte: Fundação Cecierj

Nível Ortográfico: domínio da escrita correta

No nível ortográfico, a criança alcança a capacidade de aplicar corretamente as regras de acentuação e ortografia, inclusive em palavras de ortografia irregular. Ela desenvolve o uso consistente das convenções gramaticais, como a pontuação e a separação de sílabas, em seus textos.

Além disso, a criança demonstra a capacidade de identificar e corrigir erros ortográficos de forma autônoma, refletindo um domínio avançado da escrita.

Teste de psicogênese: como identificar em qual nível de escrita a criança está?

Para auxiliar na identificação e no estímulo às crianças em cada fase, há uma espécie de manual que pode auxiliar muito os responsáveis em cada etapa.

Preparação

Para conseguir elaborar um teste e verificar em que nível de escrita a criança está, é interessante selecionar diversas palavras, com níveis de complexidade diferentes, que representem padrões silábicos e fonéticos variados. Certifique-se de que o ambiente do teste seja tranquilo e acolhedor, para que a criança se sinta à vontade e dê o seu melhor.

Aplicação

Sem nenhuma interferência, peça para a criança escrever algumas das palavras selecionadas previamente. Peça também que ela leia textos simples. O intuito é entender como ela percebe a estrutura dos vocábulos.

Registre como ela decodifica letras e sílabas e observe se a criança usa letras de forma aleatória, se consegue formar palavras através das sílabas e se demonstra familiaridade com as regras ortográficas.

É preciso identificar não apenas as respostas corretas, mas também o tipo de erro que a criança está cometendo e as estratégias que ela utilizou para ler e escrever.

Análise

Com base em cada nível de escrita mencionado acima, analise as respostas da criança para comparar o resultado do teste com os níveis já apresentados.

Feedback

Depois de identificar o nível em que a criança se encontra, ofereça um feedback construtivo e apresente um planejamento com atividades que estimulem a criança a transitar para os próximos níveis.

Confira abaixo um exemplo de folha de teste de psicogênese:

Fonte: CEF Ponte Alta Gama-DF

Como ajudar a criança durante o processo de alfabetização?

Vejamos agora algumas atitudes que podem e devem ser tomadas para auxiliar as crianças no processo de aprendizagem em cada um dos níveis de escrita:

Nível pré-silábico

É importante que as crianças sejam estimuladas a narrar histórias de livros a partir das imagens, para que possam ampliar seu vocabulário e desenvolver sua capacidade linguística.

Utilize letras e sons e explore a interação deles com as crianças. Ensine os sons de cada letra com o uso de blocos de letras ou letras magnéticas. Estimule a criança a fazer combinações aleatórias com as letras para introduzir o alfabeto.

Sugira que os desenhos feitos pelas crianças tenham uma narrativa, mesmo que sejam representados por rabiscos ou traços soltos. Esse estímulo ajuda a entender que a escrita é portadora de informações.

Nível silábico

Utilize jogos de montar palavras e sílabas para que a criança possa entender a estrutura silábica das palavras. Estimule a criação de rótulos para objetos dos ambientes; assim, será possível relacionar os nomes dos objetos com letras e sílabas.

Faça um bingo com palavras, separando-as em sílabas e criando cartelas com elas, pronunciando bem as sílabas para que as crianças possam memorizar.

Nível silábico-alfabético

Faça uma lista de palavras com uma letra faltando para que as crianças a completem, de forma a contribuir para o reconhecimento dos sons e grafia das sílabas. Crie ou compre um quebra-cabeça de vocábulos, de forma que as crianças completem palavras ao montá-lo. Aproveite os livros sempre que possível para lê-los, destacando palavras e sílabas.

Nível alfabético

Estimule as crianças a escreverem cartas, diários ou pequenos textos para que seja possível desenvolver a independência na escrita. Crie listas de palavras com erros ortográficos para que possam ser corrigidos pelas crianças; isso fará com que memorizem as regras ortográficas.

Faça ditados com palavras que sejam do seu dia a dia, mas corrija de forma individualizada para não expor os erros das crianças. Isso ajudará a memorizar a grafia correta.

Nível ortgoráfico

Para crianças no nível ortográfico, incentive a prática de leitura de livros e textos variados, destacando palavras que possam ter ortografia irregular. Promova atividades de revisão em que as crianças identifiquem e corrijam erros em frases ou textos, fortalecendo sua capacidade de autoverificação.

Organize jogos de palavras que incluam a busca por sinônimos e antônimos, ajudando a expandir o vocabulário e a compreensão de nuances ortográficas. Estimule a escrita criativa de redações e histórias, com ênfase na aplicação correta das regras de acentuação e pontuação.

Realize desafios de escrita em que as crianças precisem aplicar novas regras ortográficas recentemente estudadas. Essas atividades contribuem para o domínio das convenções da língua e ajudam a fixar a ortografia de forma prática e envolvente.

Impacto da Tecnologia nos Níveis de Escrita

O uso da tecnologia para aprimorar a capacidade de leitura e escrita das crianças já é uma realidade, e, para uma geração que nasceu conectada, é bastante razoável utilizar ferramentas para prender a atenção delas.

O papel da comunicação digital

Para melhorar ou sustentar o interesse dos pequenos, fazer uso de tablets e computadores pode ser uma das melhores saídas, já que, para as crianças dessas últimas gerações, o acesso à tecnologia é tão ou mais comum que aos livros de papel. Porém, uma coisa não pode substituir a outra.

Influência das redes sociais na escrita

Devemos tomar bastante cuidado com o que as crianças podem acessar nas redes sociais, e não é só pela segurança, mas também pela oferta de palavras escritas de forma errada e textos com conteúdo pobre.

É bastante comum vermos nas redes sociais uma forma de escrever muito parecida com a falada, mas isso não pode ser transmitido às crianças, em especial quando começarem a escrever, para não servir como um mau exemplo em matéria de grafia correta.

As abreviações e gírias podem confundir a cabecinha das crianças que aprenderam a ler e escrever recentemente, e isso pode impactar a forma como vão desenvolver sua ortografia e seu padrão de leitura; então, todo cuidado é pouco.

Infográfico dos níveis de escrita

Para complementar, também criamos um infográfico com os conceitos-chaves repacionados a cada nível de escrita:

Mapa mental sobre os 5 níveis de escrita: pré-silábico, silábico, silábico-alfabético, alfabético e ortográfico

Referências bibliográficas

  • Ferreiro, E., & Teberosky, A. (1982). Psicogênese da Língua Escrita.
  • Tolchinsky, L.(2003). Aprendizagem da Escrita: Aspectos Psicológicos e Implicações Educacionais.
  • Gontijo, C. H., & Smolka, A. L. B.(2004). Aquisição da linguagem e da escrita: perspectivas psicológicas e implicações educacionais.

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