Língua Portuguesa e Literatura para o Enem

Categoria: Filosofia da linguagem

Enunciação – conceito e características

A enunciação é uma área da filosofia de linguagem que trata do processo de produção dos enunciados. De maneira geral, os enunciados são considerados acontecimentos discursivos, ou seja, unidades de comunicação/interação entre os sujeitos. Neste artigo, falaremos detalhadamente sobre o assunto. Acompanhe!

Enunciado e enunciação: qual a diferença?

É comum que as pessoas confundam enunciação com enunciado, no entanto, o enunciado é o produto da enunciação. Em outras palavras, para que ocorra a compreensão do enunciado (oral, escrito ou originado de múltiplas linguagens), é necessária a definição pela enunciação, conforme a sua situação. Em outras palavras, sem enunciação não há enunciado. 

Para tornar o entendimento mais simples, podemos afirmar que é da enunciação que vêm as orientações para o sentido de um enunciado. Melhor dizendo:

  • quem enuncia: qual o seu papel social e seus conhecimentos compartilhados com o enunciatário;
  • a quem se dirige: seu papel social e conhecimentos compartilhados com o enunciador;
  • onde ocorre: lugar físico como a sala de aula, o pátio da escola, a igreja, o tribunal;
  • quando ocorre: suas inúmeras condições. 

O enunciado, embora seja uma materialidade linguística, não é uma realidade da língua, e sim do seu discurso. Em razão disso, os enunciados sempre geram efeitos de sentido e só podem ser realizados no contexto de enunciação, sempre associados a enunciados passados e àqueles que ainda virão. Atente-se ao exemplo abaixo:

  • Você vai para o trabalho de carro hoje? 

Uma vez que esse enunciado é realizado, ele pode ser compreendido de inúmeras maneiras. Isso significa que, quando alguém questiona sobre a forma de locomoção de outra pessoa, essa pergunta pode gerar muitas interpretações.

Além dos fatores contextuais que integram a situação da enunciação, também existem fatores que podem colaborar com os diversos entendimentos da mesma pergunta. Dito de outra forma, esse questionamento pode ter sido:

  • uma oferta de carona para a pessoa;
  • um pedido de carona para a pessoa;
  • apenas uma curiosidade sobre o meio de transporte que a pessoa utilizará para ir ao trabalho. 
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Análise do Discurso – o encontro da linguística com a comunicação

“O diabo está nos detalhes”. A célebre frase faz muito sentido quando se pensa na força que está por trás, ou encoberta, por uma ação discursiva. Afinal, não basta saber usar as palavras, as combinações semânticas de uma língua, para se fazer entender. A destreza gramatical, concentrada nas boas práticas da estrutura das sentenças, não é suficiente para dar conta do discurso. Este é muito mais amplo e geral.

Ceci n’est pas une pipe” ou, em português, “Isto não é um cachimbo”, tem a ver com tudo isso que se chama Análise do Discurso. Para ela, o sujeito que fala e está plenamente inserido em um contexto sociocultural, num dado momento histórico, é que importa.

Ceci n’est pas une pipe. Óleo sobre tela. Rene Magritte. 1929
Ceci n’est pas une pipe. Óleo sobre tela. Rene Magritte. 1929.

Pelo olhar da Análise do Discurso, todo discurso é carregado de ideologia e nem o uso mais rotineiro da linguagem deixa brecha para a neutralidade.

Análise do Discurso e Sistema Linguístico

A Análise do Discurso não desconsidera a relevância do sistema linguístico, mas o vê como um conceito complementar ao processo discursivo. No entanto, para esta corrente de pensamento, o discurso está inserido em um processo intimamente associado à constituição dos sentidos.

Se não, veja: quem você considera mais legítimo para dizer um “não” no seu dia a dia? Pense na quantidade de palavras que mudam de sentido dependendo de quem as emprega, da posição que essa pessoa ocupa na sua vida, de onde ela está e do momento em que as frases são ditas.

A Análise do Discurso lembra que todas estas circunstâncias sócio-históricas diferenciam as falas (e até o silêncio) deste ou daquele sujeito a partir de uma posição ideológica, permitindo construir sentidos muito distintos, segundo cada contexto. A isso chamamos formação discursiva.

Trata-se, portanto, da relação entre a linguagem e a ideologia.

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Ação comunicativa – entenda a teoria de Jürgen Habermas

Concentre-se na seguinte cena: você comprou uma estante nova no último fim de semana, mas agora tem de montá-la na sua sala de estar. Sua pretensão é finalmente organizar seus livros no móvel novo. Só que se esqueceu de que precisa de uma chave de fenda para apertar os parafusos.

Você sabe que seu vizinho tem uma caixa grande de ferramentas e vai até ele pedir a chave emprestada. Bate à porta dele e pede emprestada a ferramenta. Ele sempre foi solícito; diz que vai buscar o instrumento e volta com ele em mãos. Você agradece e volta para montar a estante.

Veja quantas camadas diferentes tem esse relato. Primeiro, a sua intenção subjetiva, que é ter uma estante nova montada na sala para organizar os livros. Segundo, a subjetividade do vizinho, que gosta de ajudar e não pensa duas vezes em aceitar emprestar a chave de fenda.

Em terceiro, uma ação prática; a sua, expressa em um discurso, sua fala, que pediu ao vizinho a ferramenta emprestada. Por fim, uma dimensão social, que define os códigos (critérios) sociais que ambos seguem para fazer valer tal interação.

Esses mundos – subjetivo, objetivo e social – estão na teoria da ação comunicativa proposta pelo filósofo alemão Jürgen Habermas (1929-).

A ação comunicativa pressupõe uma interação de, no mínimo dois indivíduos capazes de falar e de agir e que estabelecem relações interpessoais com o objetivo não só de compreender a situação em que ocorre a interação, mas também os supostos planos de ação que organizam suas ações pela via do entendimento.

De acordo com o filósofo, a razão comunicativa portanto vai além da relação individual de alguém com o mundo objetivo, chegando à relação intersubjetiva, na qual sujeitos que falam e atuam buscam o entendimento entre si, sobre algo.

Para ele, ao fazer isto, os atores comunicativos movem-se (jogam?) por meio de uma linguagem natural, valendo-se de interpretações culturalmente conhecidas, transitando simultaneamente em um mundo objetivo, em seu mundo social comum e em seus próprios mundos subjetivos.

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Wittgenstein e os jogos de linguagem

Os jogos de linguagem são a chave da teoria desenvolvida na “fase 2” do pensamento de Ludwig Wittgenstein (1889-1951), principal nome da Teoria da Linguagem. Na nova visão do teórico, o significado de uma palavra emerge a partir de seu uso na linguagem e não da forma. O que vale, portanto, é o contexto, e este é definido pelo uso que se faz das palavras e dos significantes.

Para Wittgenstein, em contextos diferentes, cada palavra assume conotações distintas. Sai de cena, neste aspecto, a relevância congelada em um dicionário do significado das palavras e entra a multiplicidade de seus usos. O usuário, de acordo com o filósofo, se transforma em um jogador. A linguagem específica, e suas regras, dá espaço aos jogos de linguagem.

O filósofo utiliza o termo jogo, porque compara a linguagem a um jogo de xadrez, considerando as palavras como peças do tabuleiro e a escolha de cada uma delas como sendo uma jogada, um lance a ser executado.

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Teoria dos atos de fala – conheça a teoria de Austin e Searle

Qual é o sentido por trás do ato de falar? Podemos fazer coisas através da fala? É possível agir através de palavras? O que, afinal, nos impulsiona a dizer algo? É isso que estuda a Teoria dos Atos de Fala.

Já vimos anteriormente com o filósofo pioneiro da Filosofia da Linguagem, Ludwig Wittgenstein, que, no jogo de linguagem, o sentido das palavras é determinado pelo seu uso em diferentes interações linguísticas. Mas daí surgiram outras questões:

O que quer
O que pode esta língua?
(Caetano Veloso)

A resposta é dada pela Teoria dos Atos de Fala, proposta inicialmente por John Langshaw Austin (1911-1960), filósofo pioneiro da Escola Analítica de Oxford, e depois incrementada por John Searle (1932) a partir da Filosofia da Linguagem.

Resumidamente, a teoria acredita que a função da fala vai muito além de transmitir informações. Para ele, falar é a expressão de uma ação e representa, portanto, uma forma de agir sobre o interlocutor e sobre o mundo circundante, dando sentido a ele. O ato de fala é, portanto, toda ação realizada através do dizer.

Para Austin, essa ideia extrapola a visão descritiva da língua, de que uma afirmação serve para descrever um estado de coisas e, sendo assim, pode simplesmente ser verdadeira ou falsa. Segundo o filósofo, algumas coisas não são ditas para descrever, mas sim para realizar ações.

Assim, conhecer e entender o contexto (quem fala, com quem se fala, para que se fala, onde se fala, o que se fala) é essencial para captar as pistas para a compreensão total dos enunciados.

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Filosofia da linguagem – conceito, origem e principais autores

Quantas vezes você já se meteu em discussões, brigas ou conflitos por falta de compreensão do que foi dito? Em quantas oportunidades teve de dar um tempo durante uma simples conversa para que uma palavra ou uma expressão dita por alguém fosse corrigida, refeita, reavaliada ou reafirmada a partir de uma nova intenção? Se isso já aconteceu com você, fica mais fácil perceber a importância de entender melhor o complexo fenômeno que está por trás do que se chama linguagem.

Percebe que no cerne disso a linguagem aparece como forma de expressão difusa do pensamento e de visões diferentes do que é a realidade? Esta compreensão é filosófica e esbarra na linha da Filosofia da Linguagem.

Este ramo da Filosofia se dedica a investigar não só as palavras como forma de se relacionar com as pessoas, mas também o sentido delas como termos, expressões e frases que se constroem dentro da estrutura de pensamento humano.

Mais do que isso, a Filosofia da Linguagem tenta apreender o que se passa de fora para dentro e de dentro para fora de cada pessoa. Não é, portanto, apenas uma reflexão sobre as relações estabelecidas com o mundo exterior, mas também sobre a formação das concepções íntimas do pensamento.

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